quarta-feira, 22 de março de 2017

Mar

Sentei-me a ver o mar, as ondas batiam nas rochas, como à minha revolta. "Porquê? Porquê? porquê?"... A imensidão das águas seriam do tamanho das minhas lágrimas. Eu sabia que lá habitava uma sereia, ensimesmava que ela dali emanasse, já sem pecados. Eu era frágil e crédulo. Depois ele veio, com ar de galã, acirrar o meu desejo tortuoso por Regina. "Ela pode estar viva, o putativo corpo nunca apareceu." Fiquei ali, dias, anos, sentado em frente ao mar, a desenhar e a escrever. Não queria pão nem óbolos. Tragam-me canetas e papel, e umas asas para voar. Dormi em bancos carcomidos pelo tempo, cravados com os nomes dos namorados que juravam paixões eternas. Que tolos! Que românticos! Humedecia os lábios com as minhas lágrimas e provava o sal da água, que mais dia menos dia, me iria derreter pelo sol cálido. A minha almofada era o diário de Rita, também sofreu como eu, foi vítima dos abusos da violência doméstica. Nas noites de maior insanidade repousei sobre a campa da minha amiga Dona Leonilde, mãe de Rita. Fazes-me falta, velhinha! Eu nunca fui o teu neto, mas amei-te como tal. Agora ouço a tua oração ao meu ouvido. Tudo reverdece dentro de mim, são rosas, camélias, eu ouço uma criança atirar pedrinhas ao mar. As ondas batiam na areia, como o meu coração no meu peito. Fui ao seu encalço, é perigoso estar aí. As águas engoliram-me, ou seria o beijo de Regina, a levar-me consigo... Os nossos corpos são de sal e o nosso amor uma quimera! Tiago Seixas
Inspirado em "Os Pássaros também choram"

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